“Estamos no mesmo fuso horário que os americanos”. Esse, vejam que coisa triste, é o principal argumento dos executivos brasileiros para a crença na transformação do país num grande centro global de offshore, especialmente para desenvolvimento de software. Explico: empresas de países desenvolvidos perceberam que o processo de criação de programas de computador poderia ser desmembrado, e a parte mais chata do trabalho feita por profissionais cuja hora de trabalho custa muito menos do que na sede dessas empresas. Índia e China despontaram como potências do offshoring. Como esses dois países ficam do outro lado do mundo, os brasileiros se saíram com essa: estamos aqui do lado, mesmo fuso, é só ligar e nós atendemos. Pergunte a um desses executivos por que, então, o país não abocanha sua fatia desse mercado. Xi, é uma choradeira danada: é o governo que não apóia, é a carga tributária, são os encargos trabalhistas, são os gringos que não confiam na gente, é Deus que se esqueceu de suas origens e virou americano.
Nunca entendi esse negócio do fuso horário. Porque, vejam, o processo de desenvolvimento de software envolve várias etapas. Na parte de desenvolvimento propriamente dito, podemos citar programação, testes e homologação. Ora, suponha que um certo módulo de um novo software requeira 8 horas de programação, 4 de testes e 4 de homologação. Terceirizando a programação para a Índia ou China, o serviço será feito enquanto é dia por lá, enquanto os americanos dormem. Quando eles acordam e vão trabalhar, já têm código pronto esperando por eles e pelos testes e homologação. O fuso horário oposto é, portanto, uma vantagem: terceirizando esse serviço para o Brasil, por exemplo, testes e homologação seriam feitos em dias alternados, já que seria necessário esperar o trabalho dos brasileiros.
É tão óbvio que desconfio da sinceridade de quem cita o fuso horário como grande vantagem competitiva. Será que esses caras estão querendo é corte de impostos e informalização das relações de trabalho? Se for isso, estou com eles. Desconfio, porém, que há mais que isso. Acho que nego está querendo é um dinheirim do governo. Os cineastas podem, por que não os empresários de TI, não é mesmo?