Quanto mais eu olho o mundo, menos eu entendo. Eu sou bem burrinho, é verdade, mas não é só isso. Tomemos as religiões. Como é que o sujeito escolhe a religião que vai seguir? A impressão que eu tenho é que nego pega a primeira que aparece, e então passa a defendê-la com paixão e fúria. Estupidez. Há por aí religiões que são exclusivistas, e isso é um perigo. Suponha, por exemplo, que você é um homem bomba. Amarra os explosivos no corpo, veste a roupa, verifica o mecanismo do detonador, se despede da mulher e dos filhos e sai de casa feliz, pronto para cumprir seu dever. Tudo porque no céu há 72 virgens sedentas esperando por você. Suponha, porém, que após explodir a si mesmo numa rua de Jerusalém, matando vinte pessoas, você descubra (tarde demais) que certos mesmo estavam os cristãos. Danou-se: enquanto cai pela boca do poço que leva ao inferno, você vê lá em cima Jesus Cristo rindo da sua cara. Enquanto isso, o Profeta o espera lá embaixo. “Pô, Maomé”. “Tá, tá, já sei. Todo muçulmano que vem pra cá vem logo reclamar comigo. A gente não pode errar, porra?”
É um perigo isso, mas também há o outro lado, das religiões que não são exclusivistas. O sujeito que é espírita, por exemplo. Pra que ser espírita? Se o espiritismo estiver certo, e existir mesmo todo aquele negócio de encarnações sucessivas, sendo espírita ou não você vai cair no ciclo universal. Vai morrer, reencarnar, morrer, reencarnar, morrer, reencarnar. Repito a pergunta: para que ser espírita, se não há risco nenhum em não ser espírita? Besteira.
O mesmo serve para o budismo, o hinduísmo, uma cambada de religiões. Mesmo o cristianismo, com todo o lance de plano de salvação e o risco constante do inferno, tem lá suas tolerâncias. Um padre relativamente conservador me disse certa vez que o importante é ter o sentimento da caridade, do amor ao próximo. Segundo ele, Sócrates está salvo (o filósofo, não o doutor), assim como outros pagãos e ateus piedosos. Descarte-se, pois, o catolicismo: seja bonzinho, e está tudo certo.
Os evangélicos já não são tão tolerantes. Você precisa aceitar a idéia do sacrifício vicário de Jesus na cruz como vetor de salvação para a humanidade. Caso contrário, vai passar a eternidade queimando o brioco na casa de Satanás. No entanto, há gradações de tolerância até entre os bíblias. O pastor da igreja batista que eu freqüentava dizia que, uma vez convertido, nego não perdia a salvação nem que quisesse. Funcionaria assim: o sujeito aceita a idéia toda do plano de salvação, se converte, pois. Ainda que mais tarde ele renegue a Deus e a Cristo, o nome dele não sai da lista de Javé nem a pau. Segundo ele, então, eu estou garantido.
Segundo a Congregação Cristã no Brasil, porém, eu estou é ferrado. E vocês também, porque a crença deles é que só a Congregação é o verdadeiro cristianismo, e só por ela o homem pode escapar do fogo eterno.
Então é simples: basta irmos todos para a Congregação. As mulheres terão de usar véu, manter cabelos e vestidos longos. Os homens terão de vestir terno mesmo nos dias quentes, e andar sobraçando bíblias do tamanho de videocassetes. O que é isso, porém, diante da salvação eterna? Nada! Além do mais, poderemos beber à vontade, já que a Congregação não proíbe o consumo de álcool.
Pena que não seja tão simples: e se certos estiverem os muçulmanos? É o diabo.
Fala-se muito de fundamentalismo nos dias que correm, e fala-se principalmente mal. No entanto, se pensarmos bem, notaremos que as únicas religiões que podem valer a pena são os fundamentalismos cristãos, judeus ou muçulmanos. As três grandes religiões monoteístas levadas ao extremo. Desista, portanto, desse negócio de ir cada dia a um templo, terreiro ou o que seja, na esperança de encontrar a Verdade. É sua alma imortal que está em jogo! Concentre-se nas religiões exclusivistas, e faça sua aposta.
Ou então admita logo que não existe alma imortal, Deus, céu, inferno, nada disso. E viva sem encher o saco dos outros.