(I Samuel 10:1-16)

— Pois não, Seu Samuel, qual o rec… ARGH! QUE PORRA É ESSA?
— É azeite Saul.
— E POR QUE O SENHOR ESTÁ DERRAMANDO AZEITE NA MINHA CABEÇA?
— Estou te ungindo, estúpido. Vem cá.
— NÃO! BEIJO NÃO! SEM LÍNGUA!
— Pronto.
— HEIN?
— Você acaba de ser ungido rei de Israel. Era esse o recado de Deus pra você.
— Deus mandou você derramar uma lata de azeite no meu coco e me dar um beijo? CONTA OUTRA!
— Ó, pedaço de asno! É assim que os sacerdotes são consagrados, sabia não?
— Er… Não.
— Pois são! Javé bem que queria criar um ritual diferente para a consagração do monarca, mas anda sem criatividade. Gastou tudo no Levítico, sabe como é. Bom, não importa: você acaba de ser consagrado como rei, e livrará o povo de seus inimigos.
— Qual é, Samuel? Bêbado a essa hora da manhã?
— Ah, você não acredita, né? Pois então, alguns sinais de que estou falando a verdade: quando você voltar a Benjamim, encontrará dois homens perto do túmulo de Raquel, em Zelza. Esses dois homens vão a contar você que as jumentas do seu pai já foram encontradas, e que o velho anda preocupado com você.
— Ué, que meu pai está preocupado comigo eu já sei. E é bem provável que as jumentas já tenham mesmo aparecido. Com todo respeito, esse seu sinal aí não convence.
— POSSO CONTINUAR? Humpf. Depois disso, você irá até a árvore sagrada que fica em Tabor e…
— Mas e meu pai? Ele tá preocupado comigo!
— AZAR O DELE! Você vai pra Tabor, como estou mandando. Lá encontrará três homens. Eles estarão a caminho de Betel, aonde irão para oferecer sacrifícios a Javé. Um deles estará carregando três cabritos; o outro, três pães; e o terceiro, um odre de vinho. Eles vão lhe cumprimentar, e o segundo lhe oferecerá dois pães, os quais você aceitará. Aí…
— Peraí, peraí. Deixa eu anotar aqui… Cabritos… Pãos…
— PÃES!
— É, pães… Vinho… Tá. Pode continuar.
— Humpf. Depois disso, você irá até Gibeá.
— Putz, vou ter que andar pra cacete, hein? Não bastava você me mostrar um papel me nomeando rei, com a assinatura de Javé?
— MISTERIOSOS SÃO OS CAMINHOS DE DEUS, RAPAZ!
— …
— QUE INFERNO! Então. Em Gibeá, você irá até o monte de Deus, onde há um acampamento filisteu.
— EI! Vou brigar com os caras sozinho???
— Eu MENCIONEI isso?
Não…
— Então faça-me o favor de calar essa sua boca e me deixar falar. Na entrada da cidade de Gibeá, você vai encontrar um grupo de profetas descendo o morro, vindos do altar. Eles estarão cheios do Espírito de Deus. Sabe o que issoi significa?
— Não…
— Que estarão agindo feito uns malucos, oras: tocando harpas, tambores, flautas e liras, dançando, cantando, profetizando, que é o que os profetas fazem.
— Que mico!
— Pois é. Mas acontece que o Espírito de Deus vai se apoderar de você, que vai começar a profetizar com eles.
— Ah, não!
— Ah, sim!
— Mas e aí, o que eu faço?
— Não se preocupe, Deus guiará você.
— É isso que me preocupa…
— A mim também, mas paciência. Vai indo, você tem muito o que fazer. Encontrarei você em Gilgal, e lá ofereceremos sacrifícios.
— Hoje mesmo?
— Não. Você vai ficar lá sete dias me esperando.
— SETE dias? Por quê???
— Porque eu quero. E você, quer ser rei ou não?
— Sei lá. Hum. Acho que sim.
— ENTÃO TRATE DE ME OBEDECER, ORAS!
Saul despediu-se de Samuel, e naquele mesmo momento começou a sentir algo estranho na boca do estômago: era o Espírito de Deus chegando. Seguiu as instruções do velho vidente, e tudo aconteceu conforme ele previra. E quando chegou a Gibeá e encontrou os profetas descendo o morro, o Espírito de Deus acabou de tomar conta dele. Saul juntou-se a eles, pegou um pandeiro e começou a fazer presepadas como um legítimo profeta. Vendo aquilo, as pessoas de Gibeá ficaram espantadas:
— Eita. Que aconteceu com o filho do Quis? Endoidou?
— Ou isso ou virou profeta.
— Ué. Será que Saul também virou profeta?
— E os outros? Será que os pais deles também são profetas?
— Hein?
— Xapralá.
A Bíblia diz que a frase “Será que Saul também virou profeta” tornou-se então um ditado em Israel. Não me perguntem o sentido de tal ditado: para mim faz tanto sentido quanto aquele “No cu, pardal!”, que eu nunca entendi.
Bom, Saul voltou de seu transe, largou o pandeiro, jogou longe a guirlanda de flores que trazia na cabeça, e subiu ao morro para preparar-se para o encontro com Samuel. Lá no alto encontrou seu tio, que perguntou:
— Ô, Saul! Por onde você andou, rapaz? Seu pai estava preocupado.
— Ah. Então. Eu e meu empregado saímos para procurar as jumentas. Não conseguimos encontrar, então fomos falar com um tal de Samuel.
— Samuel? AQUELE Samuel?
— Ah, o senhor conhece?
— PORRA! Quem é que não conhece o Samuel?
— Er…
— Mas e aí, o que ele disse?
— Que já tinham encontrado as jumentas.
— Só isso?
— É. Só.
Samuel dissera muito mais, como vimos, mas Saul resolveu não contar nada. Ainda não estava tão doido a esse ponto.

Estava pensando ontem: não existe nenhuma biografia decente de Raul Seixas, né? Pois então: sei muitos de vocês vão me execrar para sempre, mas o negócio é que eu ouço Raul desde criança, e gosto muito do cara. Então pergunto: muita pretensão minha querer preencher essa lacuna e escrever finalmente uma biografia séria e bem documentada de Raul?