Samuel governa Israel

(I Samuel 7)

Um problema já estava resolvido: a Arca estava de volta a Israel, guardada por um certo Eleazar, filho de Abinadabe, numa casa no alto de um morro em Jearim. A Arca ficou na casa de Abinadabe durante quase vinte anos, sem que ninguém bulisse com ela. Deixemo-la quietinha, portanto, porque outro problema mais complicado permanecia sem solução: a opressão dos filisteus. Todos os dias o povo se lamentava e rogava a Deus por ajuda (a Edição Contemporânea da Tradução João Ferreira de Almeida diz que “… toda a casa de Israel suspirava pelo Senhor”, o que traz uma certa carga de veadagem).
Samuel crescera e tornara-se um homem taciturno e mal humorado. Cansado de ouvir tanta reclamação por todo canto, começou a brigar com o povo:
— Ah, vocês querem a ajuda de Javé, né? Então porque continuam adorando a outros deuses? Destruam suas imagens de Astarote e de outros deuses, e dediquem-se só a Javé. Porra, eu não precisava nem falar isso pra vocês, está tudo nos Dez Mandamentos e na Lei de Moisés. Mas vocês se fazem de burros, não é mesmo? Ô, povinho bunda!
O discurso contundente de Samuel, reforçado pela excelente reputação de que gozava, acabou convencendo os israelitas a largarem os deuses pagãos. Concluída a limpeza, Samuel convocou o povo para uma reunião em Mispa, e disse que ia falar com Javé e ver se tinha jeito de livrar a barra de Israel. O povo atendeu à convocação. Já em Mispa, os israelitas tiraram água e ofereceram como oferta a Javé. Vejam que situação: a miséria era tanta que os caras já estavam sacrificando até água. Eles jejuaram o dia todo — até por falta de alternativa — e confessaram seus pecados a Deus.
A notícia da reunião dos israelitas em Mispa não tardou a chegar aos ouvidos dos governadores filisteus. Todo o povo de Israel reunido em uma só cidade era uma oportunidade boa demais. Então os cinco governadores juntaram seus exércitos e marcharam na direção de Mispa. Estavam certos de impor a derrota final a Israel, e ocupar todo o seu território.
Quando os israelitas souberam que os filisteus vinham para atacá-los, entraram em pânico e foram falar com Samuel:
— Ô, Samuel! Tá falando com Javé?
— Estava, até vocês me interromperem. Caralho. Que foi, hein?
— Os filisteus vêm aí, Samuel!
— Tá. E eu com isso?
— Ô bicho grosso… ELES VÃO ACABAR COM A NOSSA RAÇA!
— Não vão não. Eu só preciso falar com Javé.
— Então fala!
— FALAREI ASSIM QUE VOCÊS ME DEIXAREM EM PAZ, SEUS PUTOS!
— …
— HUMPF!
Assim que o deixaram em paz, Samuel arrumou um carneirinho (mirrado, tadinho) e o queimou em sacrifício a Javé. Pediu mais uma vez a Deus que ajudasse o seu povo. Ele ajudaria? Samuel e todos os israelitas estavam para descobrir, porque os soldados filisteus continuavam avançando, seguros da vitória. Quando estavam quase chegando a Mispa, porém, foram surpreendidos por uma forte trovoada. O barulho e os raios os assustaram, e eles saíram correndo. Vendo que sua debandada, os israelitas saíram atrás, perseguindo-os até Bete-Car (uma cidade, embora pareça nome de concessionária), e matando muitos deles no caminho. Samuel, querendo gravar o acontecimento na memória do povo, botou uma pedra grande entre as cidades de Mispa e Sem, como memorial, dizendo:
— Até aqui Javé nos ajudou. Vamos ver daqui pra frente…
O lugar passou então a se chamar Ebenézer, que significa “Pedra de Ajuda”.
E foi assim que os filisteus, tendo infernizado a vida dos israelitas por tanto tempo, foram derrotados. Samuel passou a governar, aclamado pelo povo, e enquanto ele viveu a Filistia não voltou a incomodar Israel. Todas as cidades tomadas pelos filisteus, de Ecrom até Gate, foram devolvidas.
Samuel foi chefe de Israel por toda sua vida. Todos os anos ele ia a Betel, Gilgal e Mispa, e nessas cidades julgava as questões que lhes eram apresentadas pelo povo. Depois voltava para Ramá, sua cidade natal, onde também era juiz. Finalmente cumprira seu destino óbvio, o de ser Juiz de Israel. Em agradecimento, construiu um altar em Ramá. Tudo muito bom, tudo muito bem, e assim permaneceu por muitos anos. Depois de velho, porém, ele voltou a enfrentar problemas. E não estou falando de impotência sexual.

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