FINALMENTE! FINALMENTE!
Eu já tava morrendo de tédio com minha vida de solteiro. Mas aí veio essa garota e me salvou. Já faz algum tempo, mas achamos que seria melhor manter meio que em segredo por um tempo. Porém hoje decidimos tornar público:

EU E A ANA ESTAMOS NAMORANDO!!!

Por que vocês acham que eu resolvi ir ao Rio de Janeiro assim, de repente?
Minha menina, eu te amo…


Bah, tudo errado. Tinha reservado pro Galeão, tinha que ser pro Santos Dumont. Mas já consertei tudo. Então ficou assim: No sábado eu saio de Congonhas às 9h21min e devo chegar ao Santos Dumont às 10h11min. E volto na segunda-feira de manhã.
QUERO ME ACABAR NO RIO DE JANEIRO!!!! U-HU!!!

Sei lá o que tinha me dado nesses últimos tempos, mas andava com uma preguiça danada de ler. Mas semana passada finalmente criei coragem para começar O Idiota, de Fiodor Dostoiévski.
— Que metido! Só pra falar que lê Dostoiévski!
Puta que pariu, eu queria saber quem foi o imbecil que inventou que Dostoiévski é uma leitura difícil. Claro que ele tem livros excelentes, bons e medíocres, como todo escritor. Mas os livros bons, como Os Irmãos Karamazóvi, Recordações da Casa dos Mortos e este O Idiota, são de uma leitura agradabilíssima.
Querem um exemplo? Tem uma cena deste livro em que a noiva de um personagem vai visitar a família do noivo de surpresa. O pai dele, um general reformado, entra na sala e começa a contar uma história ótima. Leiam:
“— É uma história tola, e de duas palavras — começou o general com fatuidade. — Coisa de quase dois anos atrás! Haviam acabado de inaugurar a nova estrada de ferro, eu (já em traje civil) tratando de umas questõs sumamente importantes para mim e relacionadas com a entrega do meu serviço, comprei uma passagem e fui para a primeira classe: entrei, sentei-me, comecei a fumar. Isto é, continuei a fumar, porque tinha acendido o charuto antes. Estou sozinho no vagão. Fumar não é proibido mas também não é permitido; ou seja, é semipermitido, como de costume; e isso dependendo da pessoa. A janela está aberta. De repente, bem antes do apito, instalam-se duas damas com um totó, bem à minha frente; chegaram atrasadas; uma estava vestida da forma mais elegante, de azul claro; a outra, mais simples, metida em um vestido de seda preto desbotado. Eu sou bem apessoado, elas olham com desdém, falam inglês. Eu, é claro, não ligo; continuo fumando. Isto é, eu quis refletir, mas, não obstante, continuo fumando porque a janela está aberta, e fumando para fora da janela. O totó está no colo da senhora de azul claro, é pequeno, cabe na minha mão, preto, patinhas brancas, até uma raridade. Coleira de prata com uns dizeres. Eu não ligo. Observo apenas que as damas, parece, estão zangadas com o charuto, é claro. Uma aponta para mim o lornhão, de osso de tartaruga. Mais uma vez não ligo: porque não falam nada mesmo! Se dissessem alguma coisa, se avisassem, se pedissem, porque para isso existe finalmente a linguagem humana! No entanto, calam… De repente — e isso sem aviso, sem o mínimo, estou lhe dizendo, isto é, sem o mais mínimo, todavia como se tivesse ficado totalmente louca —, a de azul claro me arranca da mão o charuto e o joga pela janela. O trem voa, fico olhando como louco. Uma mulher selvagem; selvagem mulher, movida totalmente por seu estado selvagem; mas, por outro lado, é uma mulher da estrada, corpulenta, gorda, alta, loura, corada (até demais), os olhos brilham na minha direção, e eu, sem dizer uma palavra e com uma gentileza incomum, com a mais perfeita gentileza, a gentileza mais refinada, por assim dizer, aproximo dois dedos do totó, pego-o delicadamente pela nuca e o arremesso janela afora atrás do charuto! Ele apenas dá um ganido! O trem continua voando (…) E eu estou certo, estou certo, três vezes certo! — continuou com ardor triunfante o general. — Porque se no trem charuto está proibido, cachorro três vezes mais ainda.”
Muito bem, o que há de complicado aí? Tirando o tal do “lornhão”, que eu tive que olhar no dicionário para saber que se trata daqueles oclinhos com uma vareta comprida, é apenas uma história engraçada e muito bem contada. Nego tenta formar uma aura ao redor da obra de Dostoiévski (e de muitos outros), para fazer parecer que é inalcançável a quem não faz parte de um certo clubinho de intelectualóides aveadados.
Não caiam nessa. Leiam Dostoiévski. Vale a pena e não dói.